segunda-feira, 27 de junho de 2011

Grande insignificância

Deitado de costas pro chão
acima, só o céu
e as linhas imaginárias
costuradas pelas incessantes sinapses
minutos antes:
uma queda
De pressão? Da escada?
Nas estruturas abissais contidas no caminho?

De fato, uma chaga
vinda de uma implosão
regou o piso de sangue
um sangue de coagulação tardia
pois insistia em encarar a figura
que, buscando a fuga
rodopiou os pés no viscoso rubro líquido
e estatelou as costas na poça

afundado no charco
esperou pacientemente
as estrelas surgirem
a lua enriquecer o céu
e os olhos fecharem

de manhã, tinha nódoas na roupa
e um gosto de pólvora na boca
sentiu-se, pode-se dizer...
vencido, em uma luta dantes travada
outras vezes, várias vezes
mas, despontava como um gosto final
aquele que emerge no mais sensível paladar
a força de abrir os olhos
e deixar a cicratiz ser só cicatriz
em toda sua insignificância e grandeza

Foo Fighters - I should have know - Álbum: Wasting Light

terça-feira, 21 de junho de 2011

apontamentos sobre o tempo de folga


Foto de Sebastião Salgado

"É quase impossível esquecer o menor abandonado ,nossas dívidas, o racismo, as guerras... Mas graças à Deus, existe sempre a música" Renato Russo


Engraçado
é ter que ganhar a vida
quando ela se esvai sistemicamente
sistematicamente, que seja
pelos dedos
planos de austeridade
projetos pra posteridade
posturas de grande alcance
concordata
bancarrota
massa desfolhada
e falida
de líquido e certo
que tenho hoje
é que amanhã é dia
mais um dia
digameoquequeres
quedarteeinotempocerto
sábio daquele que sabe esperar
inda bem, inda bem, inda bem
tilintam como sinos essas letrinhas
que existem sonhos
o amor
e se esses não existirem
ainda resta a música
e se nem essa iguaria te apetece
faça o que quiser
mas veja bem,
desde que seja no armistício
chamado folga

domingo, 19 de junho de 2011

quando pensa que lá não está...



Deusa grega da memória, Mnemosine

Quebrou-se
juntou os pedaços
e, na ânsia de retornar ao que era
enveredou-se em novas formas

curvas que pinçavam os nervos peitorais

uma cavidade em especial
onde dantes, sólida, uma formação geológica
exibia sua capacidade de sobrevivência
perante os milhões de choques

em meio ao fustigado sentimento
de voltar, deletar o trauma do espatifamento
reudziu-se a um oríficio
como um poço seco
ou uma fresta, esquecida pelo encarregado da obra

percebendo isso, tentou preencher a falha
pôs de tudo lá
mas como um oco infindo
os coisas passavam
escorregavam
deixando a falha
como um esboço de Mnemosine
dos memoráveis tempos
até o referido dia do fim
fim da forma antes conhecida

quinta-feira, 16 de junho de 2011

E hoje, você está se sentindo bonita?


"O Amor é sexualmente transmissível" - do livro de Marçal Aquino, "Eu receberia as piores notícias de seus lindos lábios" - Homanagem ao professor Schianberg


Tem alguém aí?
Ou são só ruídos bastardos?
Tem alguém aí?
Atrás do que está na frente?
Tem alguém aí?
Embaixo da máscara,
ou serão máscaras ao infinito?
Alguém se espreita aqui
irrequieto, quer fugir de si
sem saber que o que consegue
em seus áureos esforços
é uma versão do ponto inical
Aqui – fronteira - Aí
só pra constar:
se tiver alguém aí
tire-me daqui por uns instantes
de minhas versões infindas
quem sabe daí
ouça melhor meus ruídos criptografados

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Estrada


Frans Krajcberg - s/t - 1961

Preencher a estrada de rabsicos
com rastros de sonhos
e amores
acelerar aos limites invioláveis
apenas o vento contra si

deixar as lágrimas dissolverem-se
no acostamento empoeirado
atropelar o medo
e os incomodados
mas lembrar-se
de acomodar ao lado
só quem interessa

pra quem o olhar não tem pressa
e o detalhe do tempo
é um vôo de borboleta

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Frio


Cena do filme "Um homem sem passado" (2002), de Aki Kaurismaki

Um frio
que rebenta os pórticos do passado
e endurece o fluxo revolto do rio
Uma temperatura mais que amena
serena e severa
Sereno e orvalho
em pedras
frieza
nos olhares rasteiros
nos pés recalcitrantes
Um congelamento sistêmico
de orgãos, sonhos
Endêmico
Engloba
o calor
das dores
Um coração frio
não sangra
não obstante
pode quebrar-se
em 2 ou 1000 pedaços