segunda-feira, 28 de setembro de 2009

maré

o mar indiviso
abraça minha solidão
maré minha amante
é o que preciso
soluça ao meu ouvido
ondas de verão
amar de água salobre
mergulho em seu interior
sobre seu calor de corpo líquido
em uma noite morna
acordo por cima do mar
deixo-me ser capturado pelos rodamoinhos
e não mais vejo a terra
mar de maré marinha
amor sem correntes
ensina seu viver
aprendo o navegar
de suas águas incríveis

domingo, 13 de setembro de 2009

Seu tênis ainda era furado, de tanto manobrar o skate. Os pés eram outros: maiores, com formas mais definidas e mais calejados. Pensou que deveria ter o skate nessa hora, pra sair deslizando no manso asfalto, rasgar sua superfície e ir direto em slides inetrmináveis ladera abaixo. Mas seus pés eram sua casa nesse momento. Queria transpor o tempo, ocupar o espaço, dissolver-se na fumaça invisível e se tornar o próprio ser urbano, humano e divino. Essa era sua hora, 19 hrs, lua cheia, bares cheios. Gritos, reavivando a vida, olhares cúmplices, palavras conjuntas. Nesse solo sabia caminhar, rodopiar e manobrar seus receios. Lembranças tantas que não se apagam, que se esquecem no calor da fala, mas as compõem ao mesmo tempo. Não queria esquecer Marcelo que seu elo com a vida se iniciou como um solo de cello, vindo da ampla gravidade para a mais doce melodia. Queria saber quem era, pra poder saber o que se é, o que não se deve perder.
Marcelo chega na roda de amigos:
- Ohhh muleque, demorô nessa caminha da hein! Chega junto que o Dinho ta contando uma história...

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Ele continuou a caminhar, saído do escritório. E aquela sinestesia fixa daquilo que parecia uma lembrança, mas era a realidade. Caminhar era sua saída, sua guarida. Motos saltavam entre os automores, habitados por pedestres de folga. Pesdestres ativos caminhavam como ele, saídos de seus trabalhos.
A pouco tempo atrás ele engoliu a própria voz, de um mudo grito que ecoou em todo seu organismo. Ele viu sua própria imagem quando criança, o tênis de furo no dedão e a unha suja de terra. Viu sua lágrima tocar o chão do quintal, e o cachorro matando sua sede como tão denso líquido. Ele viu o que ele via nesse dia, de aperto torcido no peito imberbe, que por desleixo ou liberdade vinha nu. Ouviu sobretudo os passos na sala, que como batestaca que força a fundação, fundou a dor que repuxou seu pensamento. Foi o dia de seu nascimento, seu encontro com o desencontro.
- Não vou parar - Marcelo pensava - se esse sou eu, não tenho medo.